Diz a sabedoria popular que pigarrear faz mal à voz e pode provocar irritação na garganta. Apesar disso, este hábito é, muitas vezes, associado a momentos discursivos ou a apresentações orais, sendo usado para “aclarar” ou “limpar” a voz antes de se começar a falar. Mas será mesmo prejudicial? Quais as consequências para as cordas vocais? E como podemos “limpar” a garganta sem pigarrear?

Em declarações ao Viral, António Nicolau Fernandes, otorrinolaringologista, especializado em assuntos da voz, no Hospital Santa Maria e no Hospital Lusíadas, e Tiago Alfaro, pneumologista e vice-presidente da Sociedade Portuguesa de Pneumologia, esclarecem todas as questões.

É verdade que pigarrear faz mal à voz e à garganta?

Neste caso, a sabedoria popular está correta: pigarrear pode ter consequências negativas tanto para a voz quanto para a garganta. 

“Sabemos que pigarrear faz mal às cordas vocais, à voz e à laringe [onde estão alojadas as cordas vocais], causando uma inflamação que pode ser transmitida também à faringe”, explica António Nicolau Fernandes ao Viral.

O ato de pigarrear ocorre quando é provocado um “aumento da pressão” na laringe, que dá azo a um movimento de abertura e de fecho “rápido e violento” das cordas vocais, fazendo com que estas “batam violentamente umas nas outras”.

“A longo prazo, pode ocorrer uma inflamação local ou hematomas das cordas vocais, com pequenos sangramentos”, prossegue o otorrinolaringologista.

No mesmo sentido, o pneumologista Tiago Alfaro afirma que, à semelhança da tosse, também o ato de pigarrear “provoca esforço nas cordas vocais e na garganta”, o que pode “causar irritação e inflamação”.

“Se pigarrear uma ou outra vez, as consequências podem ser positivas porque retira excesso de excreções”, esclarece. 

No entanto, salienta o pneumologista, “quando se torna um hábito sem causa subjacente, a pessoa sente algum tipo de alívio, mas já não vai haver vantagem”, podendo até contribuir para o aparecimento de uma inflamação.

A situação pode tornar-se um círculo vicioso: quanto maior a irritação na garganta, maior desconforto irá sentir e mais vontade terá de pigarrear ou de tossir – o que irá, também, aumentar a irritação.

Além da irritação, existem múltiplos fatores que podem estar associados a uma sensação incómoda na garganta: excesso de muco, inflamação local, alergias, asma, exposição a irritantes, refluxo gastroesofágico, consumo de tabaco ou problemas neurológicos na laringe.

O otorrinolaringologista acrescenta que algumas destas sensações podem ser psicogénicas, ou seja, fruto de um sintoma psíquico que se torna físico.

Como aliviar a garganta sem pigarrear?

Existem outras técnicas que podem ajudar a aliviar o desconforto na garganta sem prejudicar as cordas vocais, nomeadamente beber água ou realizar a chamada técnica do “H forçado”, que, segundo António Nicolau Fernandes, consiste em “expulsar o ar como se estivesse a limpar óculos”.

Se a situação se prolongar no tempo ou se interferir com as vivências do dia a dia, é aconselhável procurar ajuda de um médico especialista. O profissional de saúde irá começar por identificar a origem da sensação na garganta, com o objetivo de reduzir a necessidade de tossir ou o hábito de pigarrear.

Em suma, é verdade que pigarrear pode ter consequências negativas para a voz. Se for um hábito repetido, poderá estar associado ao desenvolvimento de irritação, infeção e hematomas nas cordas vocais.

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